Ainda tropeço de ternura por ti


Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti
(Alexandre O'Neill)




Cheguei da minha viagem, fui à esquina do Zé, ao nosso café, a Paris, a Lisboa, à Praia Deserta, fui a todos os lugares conhecidos e desconhecidos a que podia ir. Fui de barco, de comboio, de bicicleta, de avião, de balão, a pé, de autocarro, de carrinho de mão, de boleia, de mil e uma maneiras possíveis. Fui, e voltei numa só noite.
Fui para ter que voltar a entrar numa casa mais vazia, com tudo no sítio, com todos os quadros e todos os objectos, mas sem os teus, sem ti.
Estou em frente da porta de entrada. É a primeira vez que tenho que tirar a chave para a abrir pois não vale a pena tocar à campainha se ninguém me vai ouvir, rodo a fechadura e entro. É impressionante como as paredes me parecem com um branco mais incolor, é impressionante como o teu cheiro ainda permanece e o teu sorriso se mantém constante nas fotografias, é impressionante como te consigo ouvir a dizer "como te correu o dia de hoje?", é impressionante como te consigo sentir tão bem aqui, na nossa, minha casa.
Queria que te fosses embora daqui, que me deixasses esquecer-te mais facilmente, queria deixar de te ver por todo o lado, mas a verdade é que não consigo deixar de falar contigo mesmo que aqui não estejas, não consigo imaginar que já não te encontras realmente, não consigo abrir as janelas com medo que o vento leve o que ficou de ti e não consigo ir buscar um caixote para te arrumar no armário do quarto onde quase não vou. Porque afinal quem me impede de ficar aqui a viver numa ilusão? Ninguém, sem ser eu própria. Aliás até podias ser tu a impedir-me mas como tu não vais voltar estou aberta ao destino que eu escolher. Não tem que ser o destino certo, tem que ser apenas aquele que ainda me permite largar um sorriso por achar que ainda tenho parte de ti.
Uma das coisas que aprendi contigo foi a sorrir, a sorrir a cada instante que pudesse, a sorrir mesmo sem motivo evidenciado, sorrir só por sorrir. Sorrir para as pessoas quando ando vagueada pela rua, rir para elas como se me fossem conhecidas, acenar-lhes e dizer-lhes "bom dia" só para alegrar a manhã de toda a gente, porque afinal, se nós não estamos como gostaríamos, sempre podemos viver com o consolo de ver os outros melhor que nós.
É dificil não te ter aqui no corredor, mas há coisas que não podiam ser de outra forma, há coisas que têm que ser como são, e nós só nos tentamos convencer de que as podiamos alterar, vivendo na crença de que podiamos ter feito de outra maneira. NÃO! Tu tinhas que te ir embora e eu não te podia pedir para ficares, porque tu não devias ficar mais preso a mim, neste mundo de monotonia em que viviamos.
Mudei de ideias, vou escolher fazer aquilo que tem que ser feito, um passo para a lenta (mas que tem que ter um ínicio) evolução: amanhã vou começar a pôr tudo no armário, porque é assim que deve ser, é assim que eu quero que seja, é assim que tu querias que fosse. Por mim, por nós.

MB

11 comentários:

Maria Francisca disse...

Gostei. Relembrou-me algumas histórias minhas.
Está muito emotivo. *

Rumo das palavras disse...

Que texto bonito Maria Beatriz.
E em relação às fotografias que acompanham os meus posts, nem imaginas o tempo que perco para as encontrar.

luis nuno barbosa disse...

amanhã, é sempre amanhã. será que amanhã vais dizer "é hoje"?

adorei o texto =)

luis nuno barbosa disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
luis nuno barbosa disse...

de nada =)

Anónimo disse...

Mesmo que as coisas acabem por ir embora para longe de nós, tudo o que elas nos ensinam fica sempre no nosso interior... Ainda que um dia não sintas da mesma forma isso tudo, a verdade é que vai sempre permanecer algures em ti um pedaço de memória e vais regressar de quando em vez a todas essas sensações que tantas vezes adoraste e que agora doem!

Mara disse...

Força! Muita.
Vai custar mas sabes que, ao menos, estás a fazer alguma coisa por ti mesma. E acredita que isso é muito gratificante.

beijinho doce*

Carolina disse...

Sabes que quando nos agarramos muito a uma pessoa é difícil deixá-la ir, mas independentemente disso tudo tens de sorrir, pelo menos tentar, estás rodeado de pessoas que gostam bastante de ti e que apoiam sempre.
Alguma coisa, estou cá Maria.

Grande beijinho princesa. *

Mike disse...

Não deixes que o passado te afecte, aprende com ele, e melhora o teu futuro, originando novas opurtunidades e saídas que surgem com o destino. Tu não controlas o teu destino, mas podes fazer com que ele corra melhor ou pior. E dependendo das tuas escolhas, assim se sucederá. Uma coisa, sabes, e eu também sei. Eu, independentemente das tuas escolhas, decisões, acções, estarei sempre aqui para ti. E esse sempre é um futuro inalterável.
Acredita em ti, e todos o farão.
Beijo Best*

ana cristina disse...

que lindo :)

P' disse...

Juro que amei , mesmo *.*